Era uma noite escura e fria. O que ela mais desejava era um bom filme, chocolate e a companhia dele. Na verdade, já não sabia mais se era dele essa companhia que lhe traria completude. Teve dúvidas.
A rua estava pouco iluminada e tratava-se de uma noite de domingo como outra qualquer. Já estava ansiosa por voltar para casa e proteger-se daquele frio típico de inverno e não muito suportável para uma carioca que se preze. Finalmente, o padre dera a bênção final e ela podia ir para casa pronta para enfrentar mais uma semana tentando pôr em prática aquilo que ouvira e que achava tão utópico a partir do momento em que reconhecia sua humanidade.
Ao sair da igreja, antes mesmo que pudesse sentir que o frio aumentara, deparou-se com ele a esperá-la com o maior dos sorrisos. Lembrou-se que nunca em sua vida alguém demonstrara ser tão feliz ao estar com ela como ele. Sentiu-se péssima. Já não podia mais retribuir aquela alegria da mesma maneira. Deu-lhe um beijo tão fraterno que mais parecia um daqueles que dava em seu pai ao chegar em casa. Disse fraterno. Partiram.
Esperavam pelo ônibus havia uns vinte minutos. Não entendiam o que acontecera no trânsito daquela cidade. Tudo estava parado demais, mas aproveitavam para conversar sobre seus respectivos dias de domingo.
De repente, em meio àquele silêncio preenchido apenas por suas vozes e uma música que tocava no bar da esquina, um ronco de motor foi se aproximando e ficando cada vez mais forte. Junto com o motor, podia-se ouvir um barulho seco que mais parecia algo que ela preferia nem imaginar. Direcionou seus olhos de encontro àquele carro. Na verdade, eram aqueles. Quanto ao barulho... o que temia. Tiros.
Depois de muito tempo, pôde sentir o frio subir por todo o seu corpo novamente, mas era um frio diferente daquele que sentira anteriormente. Lembrou-se daqueles que amava, mas se esquecera de um. Aquele que, no mesmo instante, realizava uma das maiores provas de amor que ela já recebeu. Pois, enquanto imaginava aquelas balas mais frias ainda transpassando seu corpo e acabando com o calor de sua juventude e de sua vida, estava ele a sua frente protegendo-na; pronto para permitir que toda aquela frieza invadisse seu ser. Estava disposto a esfriar-se, pois o amor que morava nele haveria de aquecê-lo por toda a eternidade.
Ela parou. O mundo, para ela, parou diante daquele momento. E percebeu que o frio não vinha de fora. Era um frio que o fim da paixão provocava. Sentiu-se como uma rainha incapaz de retribuir o carinho de seu súdito. Sentiu-se incapaz. Não entendia como podia ser tão indiferente a alguém que era capaz de dar a vida por ela.
O ônibus veio e, antes que ele pudesse se dispor a entrar, ela cumprimenta-o com um beijo finito. Finda. E abre as janelas do ônibus, pois não é capaz de suportar o calor que faz ali.
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